terça-feira, 29 de maio de 2007

INTRODUÇÃO

Não vou escrever sobre o que é o autismo. Muita informação existe neste mundo da informática. Prefiro indicar alguns sites por onde passo:

Ver "Por onde andar"

Não vou descrever como tudo aconteceu... a minha grande pretensão é partilhar aquilo que vivo com este menino e como diariamente lutamos contra o preconceito, as dificuldades e como no final, com esperança e muito trabalho, sairemos vencedores desta batalha.

Neste momento encontro-me a ler "Autista, quem...? Eu?" - de Ana Martins.
Tive de parar após ler as primeiras 5 páginas... aquelas palavras... parece eu a escrever! Fui eu que escrevi isto?? Nããããooo... foi uma mãe com um menino igual ao meu!

Como eu me identifico neste livro.

Até a forma como diz as cores.
- De que cor é o morango?
- Do Benfica!
- De que cor é o Benfica?
- Benfica chama-se Vermelho!

Porto chama-se Azul.
Sporting chama-se Verde.

Olho para o João e tenho tanto orgulho nele!
O que ele era e o que ele está...
O diagnóstico: Atraso no Desenvolvimento com Espectro de Autismo Só passaram 6 meses... mas já posso dizer que existe um antes e um depois!

Dizem que o João é um menino bom para ser trabalhado.
Fala e já nos olha nos olhos quando pedimos.
Já brinca ao faz de conta!

Risperdal e terapia na APPDA-Lisboa, com a Ana.

Tenho dias que não me sinto assim tão orgulhosa, tão feliz... Quando o João tem as suas crises é desesperante. Sinto-me impotente. Mas o tempo vai passando e vamos aprendendo um com o outro qual a melhor maneira de o fazer-se sentir bem neste Mundo...

Tenho de reconhecer que o saldo é positivo.
Quando vejo um sorriso.
Quando oiço uma frase mais elaborada.
Quando oiço uma palavra dita na perfeição...
Quando sinto um raciocínio...

O João está a ser puxado para este Mundo e está a conseguir integrar-se de uma forma positiva.
Eu sinto que o João está a tornar-se uma criança Feliz!

E sentindo que ele está feliz, consigo contribuir para uma melhor harmonia em casa entre nós os três: eu, Joao e José.

Quanto mais aprofundo este tema, quanto mais informada estou sobre este problema, mais angustiada fico.
Apercebo dos grandes problemas e fico com medo.
Sinto que neste momento tornei-me uma mãe-galinha. Algo que nunca fui até agora! Quero só proteger o João de tudo e de todos.
De tudo o que o rodeia e o possa colocar em perigo e de todos os que lhe possam causar mal estar.
Quando não o posso fazer fico em sofrimento... Causando mal estar a quem se encontra à minha volta. Isto até estar de volta com ele. Até o sentir seguro. E essa segurança passa sempre por estar ao meu lado, pois eu sei o que pensa, o que sente e o que devo fazer!

É uma confusão enorme de sentimentos!

Na escola o João está a integrar-se bem. A escola está a fazer um esforço enorme para que o João se sinta integrado da melhor maneira.
Toda a terapia feita na APPDA está a ser extendida à escola e em casa... E isso já está a dar os seus frutos!
Os pais da sala do João não estão informados sobre a situação. Mas não tenho tido qualquer problema com eles. Os amigos da escola apercebem-se que o João é um menino diferente, e estão sempre a protegê-lo. O que acaba por não criar um mau ambiente na sala. A sua dificuldade de se concentrar é que destabiliza o trabalho da sala, o que implica muitas vezes, acabar por destabilizar os restantes amigos e trabalho da educadora.

Mas o esforço, paciência e dedicação de todos está à vista... Basta olhar para o João... Espero que com o tempo todos estes sinais diminuem de intensidade e o João consiga ir em frente.

Sendo o João tão pequeno, ainda tenho a esperança que tudo não passe de um diagnóstico errado... Como posso explicar aquilo que escrevo?? Que todo este trabalho que está a ser feito com o João, lhe permita sair deste diagnóstico e que consiga ser minimamente independente na sua vida emocial e social.
Sei que estou a ter uma visão muito para a frente, que não se pode ter com estas crianças.

Cada dia é um dia, cada passo é um passo... Mas eu não posso perder esta esperança. Enquanto tenho esta esperança, tenho força para esta luta. Uma luta em que sei que não estou sózinha, mas as "personagens" principais são o João, José e eu.

Muitas vezes sinto-me sózinha nesta luta... Sinto-me desamparada!
Mas não perco a força!
NÃO DESISTO!

...

Mas é muito gratificante no final ver a evolução, constatar as diferenças e essencialmente viver e sentir os momentos e emoções, que só estas crianças nos conseguem dar, transmitir, fazer ver, sentir e viver!

Se por um lado, quando tem as crises, mostra todo o seu lado de agressividade, por outro, consegue dar-nos um amor desinteressado e verdadeiro, capaz de me fazer sorrir, mesmo quando a minha grande vontade é chorar.

Muitas vezes páro e dou por mim a pensar que é um privilégio, para mim e para o José, termos um menino como o João nas nossas vidas.

Desde que o João começou a fazer terapia e a tomar medicação, a própria relação com irmão sofreu alterações! Se antes não era possivel o José dirigir-lhe a palavra, porque um simples gesto do José era capaz de colocar o João no seu estado de maior irritação, agora, o José passou a ser um modelo de imitação para o João.
E se por um lado me sinto feliz com isso, MUITO FELIZ, por outro lado, dou por mim a ralhar aos dois pelos disparates que fazem. O José serve de modelo para o João tanto para o bem como para o mal!! É muito engraçado... Muito engraçado...

Ver o João a jogar à bola com o irmão:
- Passa a bola para mim!
Ver isto num menino especial como o João... É uma conquista!

É impressionante como estas experiências na nossa vida nos fazem dar importância a pequeninas coisas.
A uma simples frase dita na perfeição, a um simples Obrigado na situação correcta, a um simples chuto na bola, pedir para fazer uma corrida, brincar às escondidas, é capaz de me fazer sentir a melhor mãe do mundo e que estou a conseguir cumprir a minha missão.

Como vale a pena continuar, porque sou recompensada da melhor forma que posso ser...

...

Quando foi feito o diagnóstico ao João... Tudo se desmoronou à minha volta.
Senti um peso de dor enorme, como já à muito não sentia.
A última vez que me senti assim, foi no meu processo de divórcio!
Uma angustia, sensação de frustação, um vazio...
Foi um período muito dificil.
Estar com o João nas sessões, nos diagnósticos, ouvir tudo o que me diziam, sem me pouparem aos pormenores... E sempre sózinha! Sempre sózinha a ouvir e a assimilar toda a informação. Pelo menos estava a tentar... Muitas vezes os meus pensamentos misturavam-se com as vozes dos médicos!
Só queria sair dali a correr. Sair porta fora do consultório. Virar costas às instituições e procurar mais opiniões! De certeza que existirá um médico que me vai dizer:
- Que disparate! O João é apenas um menino rebelde e malcriado!

Mas de todos os médicos que corri, nunca ninguém me disse isso... Apenas foram confirmando o diagnóstico inicial.

Quero segurar as lágrimas... Mas elas teimam em cair.
Não quero chorar, não quero que o João se aperceba que estou a chorar! Não consigo...
Mas na verdade aquelas lágrimas para o João não tinham qualquer significado!
Até era engraçado ver a mãe a chorar! Para ele todas as emoções passavam ao lado!
Era de tal forma indiferente e inconsciente, que na escola, muitas vezes tirava as bonecas às meninas da sua sala só para as ver a gritar e a chorar!
Isso para ele era uma brincadeira! Era muito engraçado e ria-se perdidamente por isso.

Sózinha, foi sózinha que tive de arregaçar as mangas.
Mas se foi muito dificil superar esse período, hoje sinto um orgulho enorme de mim própria.

Estou a conseguir! Estamos a conseguir!

E hoje olho para o João, e à sua maneira, o João é um menino normal!
É especial porque consegue ensinar-me muita coisa, consegue mostrar-me a beleza nas pequenas conquistas. O João consegue tirar o melhor de mim e isso deixa-me muito feliz... E com força para continuar esta luta e mostrar ao mundo, à nossa mediocre sociedade, que também eles têm direitos, também eles podem ser felizes, de uma maneira diferente da nossa, mas não é necessário serem excluídos! São capazes de fazer muito... E tenho orgulho por ter este privilégio e tenho orgulho de o mostrar a todos!
Parte de mim só quer proteger o João de toda a maldade que existe à volta da
nossa realidade, mas jamais tive, tenho ou terei vergonha do João. Jamais tive vontade de o esconder do mundo.

Realmente existem situações embaraçosas e desagradáveis.
Quando o João, sem motivo aparente, decide deitar ao chão tudo o que está à sua volta, começa a bater a quem se aproxima dele e manda calar qualquer pessoa que tente interferir. Reconheço que muitas vezes parece ser um menino malcriado, mas não é! Se tomarmos atenção, em vez de criticar ao primeiro grito que ouvimos daquela criança, conseguimos perceber que não é um menino malcriado, mas sim um menino que está ansioso por algum motivo. Não devemos, não podemos logo apontar o dedo... Mas tudo o que escrevo, por enquanto, só é entendido por alguém que passe ou já tenho passado pelo mesmo que nós.

A nossa sociedade está muito mal informada e formada para lidar com a diferença.
Tudo o que "foge à regra" é considerado anormal!

Mas muito nesta sociedade assusta-me!
Como será a integração do João na escola?
Não falo na escola onde se encontra neste momento! Mas no futuro...
Não faço questão que o João frequente a Universidade, mas gostava que tivesse as mesmas oportunidades.Caso não frequente o ensino superior que seja por decisão própria e não por não ter capacidade.
Talvez não me expresse da melhor forma... Mas acho que é compreensível aquilo que tento transmitir.
A sociedade tem de dar oportunidade a estes meninos, na mesma medida e de acordo com as suas capacidades.

Muitas vezes páro a pensar e a imaginar como será o futuro do João.
Sei que não é possivel saber, imaginar... Mas é inevitável.

Será mesmo necessário o João ter de frequentar uma escola estatal com salas Teacch? Ou terá a oportunidade de frequentar o colégio particular do irmão?
Eu sinto-me mais segura em relação ao José, mas e o João? Será o melhor para ele? Terá o colégio capacidade e condições para receber um menino como o João? Estes não eram os meus planos! Eu queria que os meus meninos andassem ambos na mesma escola! Mas será justo tirar o José do colégio onde está a fazer as suas amizades para um colégio estatal, porque é onde existem melhores condições para o João? E como terei eu certeza que o João será bem tratado?
Reconheço que não tenho a melhor das visões das escolas estatais. Sempre andei em escolas estatais e andava de transportes publicos sózinha, mas os tempos eram outros! Hoje vivemos numa sociedade mais evoluída, mas com essa evolução vêm sempre as outras consequências desse crescimento. A violência, a agressividade, a insegurança... Como vou conseguir proteger o meu menino?

Como mãe acho importante e essencial para o desenvolvimento do João ser integrado no ensino normal, o contrário também acho fundamental para as crianças que frequentam o ensino normal conviver com meninos como o João. O joão pode aprender com as outras crianças, mas não é só ele que ganha! As crianças aprendem a aceitar a diferença, a respeitar e a ser solidário.

O João frequenta um infantário e faz natação ao Domingo, em que o irmão, inclusivé também frequenta. O João fica sempre numa grande excitação para ir para a piscina. No entanto, quando a aulda decorre na piscina grande, limita-se a ficar sentado à beira da piscina. Tem sempre uma especial atenção do professor Fernando e de mais um instrutor que o acompanha durante a aula toda.

O João está a crescer. E com todo este acompanhamento é visivel toda a sua evolução. É de tal forma que por vezes questiono-me sobre o seu diagnóstico. Muitas vezes diz coisas muito certas, mas na verdade... Na verdade são frases que vai ouvindo e repetindo. Por vezes utiliza as expressões no contexto correcto, outras vezes não...

Com o meu testemunho também pretendo contribuir com exemplos de exercicios, terapias e sessões que podemos fazer.

... de uma maneira ou de outra...
TODOS SOMOS DIFERENTES!